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MEU PASSATEMPO FAVORITO / João Gabriel Batista

Olhos abertos para o início de mais um dia. Com ele, não trazia muitas expectativas, afinal esse seria só mais um capítulo na vida de uma criança de 8 anos. Me levantei, dei bom dia à minha mãe, desejei um bom trabalho a meu pai e fui tomar café. Até ali, não havia nada de especial em uma simples rotina. A desambição deu lugar ao entusiasmo quando minha mãe caminhou até mim e disse: “João, preciso que você se arrume, mais tarde vamos para BH, passaremos a tarde na casa da sua tia Help!”.

 

Consigo contar nos dedos - de uma mão - as notícias que me faziam mais feliz do que essa: “Filho, tenho ingressos para o jogo do Cruzeiro”; “Hoje vamos comprar um tênis novo” ou “Vamos viajar!”. Com um sorriso de ponta a ponta, ia até o meu quarto e pensava em escolher a melhor roupa para passar um dia tão especial, afinal, a distância, e as obrigações escolares - além dos desenhos animados -, me tomavam grande parte do tempo em uma semana, fato que fazia com que as visitas à minha madrinha fossem um tanto quanto esporádicas.

 

Permito aos leitores chamar a Maria do Socorro - minha tia favorita - só de “Help”. Ela é uma daquelas pessoas que escolhemos - ou somos escolhidos - para ter aquele “carinho especial”, que muitas vezes dispensa qualquer tipo de palavra. Em meio a tudo isso, a casa dela reservava uma das peculiaridades que mais marcaram a experiência de estar lá: o pote de vidro, de tampa verde que fica na cozinha, dentro do armário e em frente à geladeira.

 

Eu não falo especialmente do pote, e sim do que invariavelmente ficava dentro dele. Os tradicionais biscoitos Passatempo ao leite, que vinham em uma embalagem azul. Para mim, comer aquele biscoito era muito mais do que simplesmente uma pausa na brincadeira, era fechar - com chave de ouro - um momento tão especial ao lado de uma pessoa de valor inestimável.  Era assim: ela me chamava, sentávamos na mesa, ela pegava o pote de biscoitos, abria e ali mesmo dávamos gargalhadas enquanto comíamos aquele “manjar”.


 

Naquele tempo, inconscientemente, não me dava conta da grandeza que aquele momento, mas confiante, pedia a Deus que pessoas como aquela pudessem ser eternas! Nunca soube se havia algum significado por trás do apelido da tia “Help”, mas comigo carregava a certeza que ela era o socorro em meio a algumas aflições de uma criança de 8 anos.

 

Hoje só me restam os biscoitos, as lembranças, o carinho e principalmente a saudade. E, contrariando todos os pedidos que havia feito a Deus, hoje ela já não está mais aqui para que possamos, juntos, sentar na mesa, abrir o pote de tampa verde, e passarmos aquele valioso tempo juntos, o meu Passatempo favorito.  

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